O processo administrativo tributário deve obrigatoriamente regular-se pelos princípios de natureza constitucional, pelos princípios gerais de natureza administrativa e pelos princípios de natureza processual administrativa.
A fim do melhor entendimento entre a teoria e a prática, impende trazer à colação, para ilustrar, o caso de não entrega dos elementos que amparam o lançamento do sujeito passivo, no qual se observa claramente algumas circunstâncias específicas, as quais permitem apoiar o entendimento de que os vícios inerentes ao processo administrativo tributário nascem, basicamente, da ausência dos requisitos do ato administrativo e da inobservância aos princípios de natureza constitucional, aos princípios gerais de natureza administrativa e aos princípios de natureza processual administrativa.
Tal caso, inclusive, mostra-se muito representativo para situações similares, pois são inúmeras as situações processuais em que se identificam vícios processuais em virtude da inobservância e do total desrespeito dos princípios em referência, os quais mancham de nulidade ou de anulabilidade o processo administrativo tributário.
Nesse sentido, releva, incialmente destacar que a Constituição Federal de 1988, em seu artigo 146, inciso III, alínea ‘b’, disciplinou que cabe à lei complementar estabelecer normas gerais em matéria de legislação tributária, especialmente sobre obrigação, crédito, prescrição, decadência e lançamento.
Sobre a constituição do crédito tributário, o artigo 142, do Código Tributário Nacional (CTN), assim estipulou: “compete privativamente à autoridade administrativa constituir o crédito tributário pelo lançamento, assim entendido o procedimento administrativo tendente a verificar a ocorrência do fato gerador da obrigação correspondente, determinar a matéria tributável, calcular o montante do tributo devido, identificar o sujeito passivo e, sendo caso, propor a aplicação da penalidade cabível”.
Por sua vez, o parágrafo único, do artigo 142, do CTN, dispôs que “a atividade administrativa de lançamento é vinculada e obrigatória, sob pena de responsabilidade funcional”.
O fisco somente poderá promover o lançamento de ofício propriamente dito ou através do auto de infração, na hipótese em que a legislação disponha, de maneira clara, precisa e pormenorizada, todos os elementos referentes à regra-matriz de incidência tributária, quais sejam: aspecto pessoal (sujeitos ativo e passivo), aspecto material, aspecto quantitativo (base de cálculo e alíquota), aspecto temporal e aspecto espacial.
O lançamento de ofício depende de elementos indispensáveis à configuração da obrigação tributária, sem os quais o mesmo não terá condições de progredir, estando condenado à sua nulidade.
A Lei 6.949/17 (Lei do PAT/PI), que, dentre outras providências, dispõe sobre o processo administrativo tributário do Estado do Piauí, em seu artigo 23, I, II e § 1º, determina que o Auto de Infração será lavrado por servidor competente, no local da verificação da falta, e conterá, obrigatoriamente, os seguintes requisitos: I – a qualificação do autuado; II – o local, a data e a hora da lavratura; III – o período a que se refere a infração; IV – a descrição do fato; V – a disposição legal infringida e a penalidade aplicável; VI – a determinação da exigência e a intimação para cumpri-la ou impugná-la no prazo de 30 (trinta) dias; VII – a assinatura do autuante e a indicação de seu cargo ou função e o número de matrícula.
Entretanto, não basta, apenas, que o Fisco Estadual, ao promover o lançamento de ofício, observe o comando previsto no artigo 142, CTN, de maneira que identifique o fato gerador da obrigação tributária; determine a matéria tributável; calcule o montante do tributo devido; aponte o sujeito passivo; e aplique, se for o caso, a penalidade cabível.
É imprescindível que o Auto de Infração seja devidamente instruído com os documentos, demonstrativos e demais elementos que demonstrem a infração cometida pelo contribuinte ou responsável, de forma que o autuado se ache possibilitado ao exercício de sua ampla defesa, o que apenas ocorrerá na hipótese em que se encontrar de posse integral de todos os elementos que fundamentam o lançamento de ofício.
Em consonância com que determina o princípio da ampla defesa e demais princípios, o artigo 24 da Lei do PAT/PI, determina que: “O auto de infração deve ser distinto para cada tributo ou penalidade isolada, o qual deve estar instruído, conforme o caso, com todos os termos, depoimentos, laudos e demais elementos de prova que se façam indispensáveis à comprovação do ilícito”.
Desta feita, a inobservância, pelo Fisco, do cumprimento dos requisitos em referência, inclusive pela falta de entrega ou, ainda, pela entrega parcial ao contribuinte autuado dos documentos, demonstrativos, provas, etc. que alicerçam o lançamento de ofício, resulta nulidade do próprio lançamento promovido, uma vez que desrespeitaria os princípios da legalidade, eficiência administrativa, contraditório, ampla defesa, devido processo legal, motivação, verdade material e segurança jurídica.
FELLIPE RONEY DE CARVALHO ALENCAR. Doutorando e Mestre em Direito Constitucional pelo IDP/DF. Professor de Direito. Advogado empresarial.