Os crimes de responsabilidade de prefeitos vêm estampados no art. 1°, I a XXIII, do Decreto-Lei n° 201/67, sendo certo que os incisos XVI a XXIII foram introduzidos pela Lei n° 10.028/00.
Assim, são vinte e três incisos que capitulam condutas que podem ser praticadas por prefeitos municipais no exercício do mandato, nada impedindo que venha a ser processado por outros delitos capitulados no Código Penal ou na Legislação Especial.
Esses crimes são denominados de crimes de responsabilidade, mas, a rigor, são verdadeiros crimes funcionais que tem como sujeito ativo somente o prefeito municipal.
É bom lembrar que se denominam crimes de responsabilidade as condutas que caracterizam infrações político-administrativas, de caráter não penal, que sujeitam o autor, em regra, à perda do cargo ou mandato e a suspensão dos direitos políticos.
Já os crimes funcionais são efetivamente infrações penais, que tem como sujeito ativo o funcionário público (elementar do tipo), ostentando o prefeito municipal essa condição, para efeitos penais, nos termos do art. 327 do Código Penal.
O Decreto-Lei n° 201/67 adota, assim, em seu art. 1°, a terminologia “crimes de responsabilidade” como sinônimo de crimes funcionais, tipificando condutas sujeitas ao julgamento pelo Poder Judiciário e cominando as respectivas sanções penais. Já o seu art. 4°, estabelece as infrações político-administrativas que podem ser praticadas por prefeitos, sujeitas ao julgamento pela Câmara dos Vereadores e sancionadas com a cassação do mandato.
Portanto, empregando o rigor terminológico, as infrações tipificadas no art. 1° do referido Decreto-Lei, são crimes funcionais, enquanto as infrações tipificadas no art. 4° são crimes de responsabilidade (político-administrativas).
Sabendo disso, registre-se que, para efeitos penais, para que haja condenação por crime de responsabilidade, conforme o Decreto Lei 201/67, é necessário que o prefeito haja com plena consciência a respeito de sua conduta ou assuma, deliberadamente, o risco de praticá-la. Ou seja, deve haver diretamente a existência de dolo em sua conduta.
Esse foi o entendimento aplicado pela 11ª Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região ao absolver um ex-prefeito de uma cidade do interior do Estado de São Paulo (SP), em processo crime que apurava o delito de emprego de verbas públicas em desacordo com a destinação regulamentada.
De acordo com o Relator do caso, desembargador José Lunardelli, mesmo sendo o ordenador das despesas do município, o então prefeito contava com um aparato administrativo e servidores capacitados a darem suporte às ordenações de despesas feitas por ele.
“Nada nas notas é de causar estranheza, dúvida ou espanto, de modo que o prefeito age com absoluta confiança de que os quadros técnicos elaboraram a nota de empenho e planejaram o gasto público sempre em termos juridicamente corretos. É claro que, se houvesse indicativos, nas notas ou na conduta dos servidores, a indicar que algo de pouco usual ocorresse, haveria sentido em se exigir maiores esclarecimentos. Nada há a comprovar que fosse esse o caso“, registrou Lunardelli em seu voto.
O relator ressalta que o andamento da máquina pública pressupõe, em situações como a da autorização para o gasto público que um Chefe do Executivo confie, sob o prisma técnico, nos servidores capacitados dos quadros do ente que comanda.
Ao absolver o prefeito, Lunardelli considerou ainda os valores de verbas alocadas em desacordo com a destinação específica foram pequenos, considerado o período imputado na denúncia e o montante recebido pelo município.
“O total de verbas federais aplicadas em desacordo com sua destinação vinculada equivalia a, no máximo, 2,5% do total de recursos federais enviados apenas para o setor de saúde. Se a comparação for feita em relação ao orçamento municipal de saúde, tais transações correspondem a menos de 0.2% do total do orçamento de saúde do município“, explicou o relator.
Lunardelli apontou, ainda, que, mesmo tendo havido o emprego de verbas com destinação específica em desacordo com a regulamentação original, grande parte se destinou a outras subáreas da secretaria de saúde, como por exemplo o uso de despesas da atenção básica para os tratamentos de média e alta complexidade.
“A quase totalidade das aplicações de verbas em desconformidade com sua destinação se deu em outros setores subordinados à Secretaria de Saúde do Município, o que reforça a conclusão de falha técnica do aparato administrativo na execução e bom emprego das verbas federais, mas não demonstra qualquer dolo na aplicação, pelo réu, de verbas em desacordo com sua destinação“, concluiu Lunardelli, absolvendo o prefeito.
Sabendo disso, registre-se que fica evidente por meio de entendimentos consolidados dos Tribunais Superiores que, para que haja condenação de Prefeito em crimes de responsabilidade, é evidente que deve ficar comprovado o dolo de sua conduta. Caso contrário, o processo caminhará para a sua absolvição.