O Superior Tribunal de Justiça (STJ), sob a relatoria da Ministra Nancy Andrighi, negou provimento ao Recurso Especial nº 2.174.724/SP interposto por uma credenciadora de cartões., em facebri de uma empresa de máquinas agrícolas. O propósito central do julgamento da Terceira Turma foi decidir sobre a abusividade da cláusula que imputa exclusivamente ao lojista a responsabilidade pelo cancelamento de pagamentos realizados com cartão de crédito, conhecido como chargeback.

Inicialmente, cumpre destacar que o chargeback constitui uma estratégia antifraude no mercado de pagamentos eletrônicos, sendo o mecanismo pelo qual a venda realizada com cartão de crédito ou débito é cancelada, seja porque o titular do cartão não reconhece a transação, seja porque a operação foi efetuada em desacordo com as regras contratuais das administradoras de cartão.

Como consequência, o lojista perde do valor da venda, que é retido pela operadora de pagamento, além de custos com taxas e possíveis prejuízos com o produto e frete. Embora esse mecanismo seja relevante para segurança das operações, tornando o uso do cartão de crédito mais confiável para compras, ponderou o STJ que atribuir a responsabilidade de forma absoluta ao lojista equivaleria a transferir-lhe integralmente o risco da atividade da instituição de pagamento, inclusive os riscos decorrentes de falhas em seus próprios sistemas, o que atentaria contra a boa-fé contratual e o equilíbrio entre as partes

Sendo assim, a responsabilização do lojista só seria admissível quando fosse demonstrado o descumprimento das obrigações contratuais assumidas ou se for comprovado que a conduta do lojista (à luz do dever de cautela que rege os atos de comércio) contribuiu de forma decisiva para o êxito do ato fraudulento

Observa-se, outrossim, que o entendimento do STJ é um alerta severo no sentido de que seja no âmbito do consumo ou na relação puramente empresarial, a cláusula contratual que impõe o ônus da fraude de maneira absoluta e sem comprovação de culpa ao comerciante é inválida, sob pena de violar a ética contratual e desequilibrar a cadeia de pagamentos.

Por fim, é tempo de rever a forma como o risco é partilhado no dinâmico e complexo mundo das transações digitais, garantindo que o direito à retenção de valores seja sustentado por provas e não apenas por disposições contratuais unilaterais.

BRUNA FERREIRA DE ANDRADE PEDROSA. Advogada empresarial. Pós-graduada em Direito Tributário e Processo Tributário pela Fundação Escola Superior do Ministério Público do RS. Certificação Profissional em implementação e gestão de Compliance Anticorrupção (CPC-A) pela FGV – LEC.