A lei processual civil brasileira vigente, o Código de Processo Civil de 2015, atribuiu à solução consensual de conflitos o status de norma processual fundamental quando expressamente refere que meios como a Conciliação, a Mediação, entre outros deverão ser estimulados pelos operadores do Direito, significando que o Código adotou a concepção de Justiça Multiportas ou Multidoor Courthouse, introduzida pelo professor Frank Sander, em 1979, nos Estados Unidos.
A concepção de acesso à justiça pelas multiportas se traduz na ideia de que o Poder Judiciário é apenas uma – e não a única – das várias portas disponíveis para se resolver conflitos. A Mediação, a Conciliação, a Arbitragem são as portas mais conhecidas, mas não são as únicas, de forma que, a partir das características de cada uma delas e do próprio conflito, será possível identificar qual delas será a mais adequada a tratá-lo.
Portanto, a partir desta ideia de meios adequados – e não de mera alternatividade ao Poder Judiciário – entende-se relevante o estudo do chamado dispute board, concebido, originalmente, como método capaz de resolver conflitos oriundos de contratos de construção.
O tema proposto ao presente estudo é decorrente da complexidade e controvérsias inerente a este tipo de contratação na medida em que uma obra de engenharia é suscetível a inúmeros riscos e intercorrências como erros de projeto, alterações do objeto contratado, acréscimos não previstos, ocorrências climáticas, que podem acarretar paralisação da obra seguida de inúmeros prejuízos à obra e às partes. Ou seja, uma atividade imensa em uma sociedade de muitos conflitos que exige soluções rápidas e eficazes.
Em países como Estados Unidos e Reino Unido, nos quais o dispute board vem sendo adotado, sobretudo em contratos de construção, vem obtendo destaque por seu alto índice de solução de controvérsias de forma que em alguns poucos casos as decisões são rediscutidas na Arbitragem ou no Poder Judiciário.
O dispute board consiste em ‘uma junta de profissionais capacitados e imparciais formada, em geral, no início de um contrato para acompanhar o seu progresso e resolver disputas que, eventualmente, venham a surgir ao longo de sua execução.
A presença do comitê contribui para que a controvérsia surgida entre as partes venha a ser solucionada pari passu à execução da obra, evitando a sua paralisação e eventuais prejuízos financeiros às partes; além de apresentar custos inferiores se comparado com as custas de um processo judicial ou de uma arbitragem.
Analisa-se, também, a aplicação dos dispute boards no Brasil, observando-se ainda uma tímida presença. Porém, algumas entidades brasileiras já possuem Regulamento sobre dispute board, como a Câmara de Arbitragem e Mediação do Instituto de Engenharia, o Centro de Arbitragem e Mediação da Câmara de Comércio Brasil-Canadá, a Câmara de Mediação e Arbitragem do CREA/MG.
E, ainda, assinala-se que a nova Lei de Licitações e Contratos Administrativos, Lei n. 14.133, de 1º de abril de 2021, acompanha a firme tendência brasileira quanto a compreender a jurisdição em sua acepção ampla, trazendo diversos meios de resolução de litígios, uma vez que a novel lei, no seu Capítulo XII, dedica-se inteiramente aos meios alternativos de solução de controvérsias, com tratamento expresso ao “comitê de resolução de disputas”.
Ou seja, a aplicação próspera dos dispute boards passa pelo desenvolvimento de sua funcionalidade preventiva, manifestando-se através de correções de rumo na execução dos contratos administrativos, geralmente relacionados à área da infraestrutura, de forma que o comitê poderá expedir recomendações às partes envolvidas justamente com o objetivo de evitar litígios que, sem elas, provavelmente culminariam numa custosa disputa arbitral ou longa batalha judicial.